A ORIGEM DO AGRADECIMENTO OBRIGADO.

Obrigado tem origem histórica : é redução de expressões que se usava no fecho de correspondência, em que o remetente declarava-se “atento, venerador e obrigado ” em que “obrigado” significava a obrigação de reciprocar o favor, a gentileza, a atenção.

Com o andar dos tempos, este particípio passado perdeu sentido de obrigação (moral ou social) e tomou valor de gratidão.

Assim, hodiernamente, obrigado = sou-lhe grato.

Constitui confusão tomar a palavra obrigado, no sentido em que a usamos, como se a usássemos em sentido que lhe é estranho : é-lhe estranho o de obrigação, que, como disse, evolou-se (há cerca de 120 anos) e foi substituído pelo de gratidão.

No Brasil há coisas estranhas, como a de tomarem-se palavras em seu sentido obsoleto, de séculos atrás, e recusarem-nas à conta desse mesmo sentido, já apagado. Os tipos descobrem que há 80, 100, 200, 300 anos, dada palavra tinha dado sentido (que já perdeu) e criticam-na e enjeitam-na por causa dele, como se seu sentido atual fosse o de séculos atrás. São mentes confusas.

Outros exemplos : fica proibida a palavra “rapaz”, pois provém de “rapace” = ladrão, mas fica autorizada a palavra puta, por provir do nome da deusa Poda.

A etimologia é interessante, elucida a gênese dos vocábulos, até evidencia as mutações diacrônicas (ao longo dos tempos) de significado das palavras. Isso é uma cousa ; outra é a acepção atual das palavras.

Também censura-se mulato por provir de mulo, macho da mula, que por sua vez provém de misto, misturado ; depreendem que chamar mulato é o mesmo que chamar mulo, embora não atentem para que jamais mulato foi pejorativo e há séculos ninguém se lembre de que mulato provém de misturado, salvo gente que confunde cousas.

Há, no Brasil, censura lingüística e o funesto politicamente correto em idioma.

Há alguns livros de etimologia, muito populares, em que certos leitores confundem acepções pretéritas com acepções coevas. No fundo, é a ignorância que se manifesta, a ignorância militante, em que homem raciocina assim: séculos atrás, tal palavra, como “rapaz”, significava ladrão ; logo, chamar, atualmente, rapaz a alguém, equivale a apodá-lo de ladrão ; destarte, devemos evitar chamar rapaz a alguém, pois fazê-lo equivale a qualificá-lo de ladrão.

Tal modo de ver é perfeitamente estúpido.

Também o é censurar os verbos judiar e denegrir, pois, alegadamente, conteriam preconceito contra judeus e contra negros. Está-se, aí, no domínio da ignorância, da estupidez, do obscurantismo.

Os homens respondem obrigadO ; as varoas, obrigadA, sempre. Sempre é sempre, isto é, as varoas dizem obrigadA para varões e para varoas.

Segundo alguns, dizer obrigado comunica espírito de obrigação, de sujeição, de submissão e (consoante a tal interpretação) devemos erradicar tal agradecimento, em nome da liberdade individual. Não tem nada que ver uma cousa com a outra. Como já expliquei claramente, obrigado significa agradecido, estou-lhe grato, rendo-lhe graças, bem-haja.

Pensar que obrigado implica sujeição equivale a imputar-lhe sentido inexistente há décadas, a fantasiar, a imaginar cousas, a reger-se pela fantasia, que não pela realidade. É cousa de mentes confusas.

Bem-haja é expressão que exprime voto de que a pessoa haja o bem, tenha o bem, que lhe esteja tudo bem, e tem valor de gratidão. Bem-haja = obrigado. Podemos usar à larga essa locução.

Agradecido é explícito em manifestar gratidão ou agradecimento, o que não se dá com obrigado (particípio passado de obrigar) que, no entanto, aí, não vale como verbo e sim como agradecimento.

Gratidão é sentimento abstrato; agradecer com esse vocábulo transmite agradecimento que até se entende como tal. Obrigado é particípio passado do verbo obrigar; agradecer com esse vocábulo transmite agradecimento que se entende como tal. Temos livridão (liberdade) de usarmos um ou outro : façamo-lo em nome da riqueza semântica do português, não com espírito de confusão que injustiça o “obrigado”.

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