MISCIGENAÇÃO, PSEUDO-FATOR DE ATRASO DO BRASIL.

MISCIGENAÇÃO, PSEUDO-FATOR DE ATRASO DO BRASIL.

Nos anos de 1910 e 1920, era consensual julgar-se maléfica a miscigenação de brancos com pretos, no Brasil, como fator de atraso nacional; passava por fator de inferioridade a existência de mulatos e mamelucos, produtos do cruzamento do português com o negro e com o índio.

 As colonizações inglesa, holandesa, belga, francesa, na África, assentavam-se no conceito da superioridade racial do europeu branco sobre os pretos africanos, o que levou, como extremos, a segregação institucionalizada na África do Sul e ao racismo feroz dos ingleses e dos seus descendentes nos E.U.A.

  No Brasil, jamais houve legislação segregadora dos pretos em relação aos brancos; não houve racismo odiento, com enforcamentos e linchamentos de pretos até os anos 1920, nem instituições como a Ku Klux Klan.

 Ao contrário, o português não discriminava por cor nem por etnia, o que, segundo Gilberto Freyre, atenuou as durezas da escravidão e aproximou os homens brancos das mulheres nativas, entrosamento mais humano do que a separação de raças ou de cores.

 No Brasil, vigia a tradição henriquina: os primeiros escravos negros que adentraram Portugal, em meados do século XV, foram adquiridos pela família real e pela alta aristocracia. O infante dom Henrique acolheu-os, acarinhou-os e deu o exemplo de que escravo é gente e se trata bem.

 Disto originou-se o etos presente no meio luso-brasileiro, de que se deve tratar bem o escravo. Os viajantes estrangeiros que observaram o Brasil colonial coincidem em que aqui os escravos eram mais bem tratados do que nas colônias de outros países.

 Ainda que no Brasil haja algum preconceito contra negros, a observação da história é a de que ele foi muito mitigado em relação ao que teria existido se o Brasil fora colonizado por ingleses ou holandeses.

 Augusto de Lima Júnior, sobre Minas Gerais: “Outra superioridade do espírito português, na vida colonial em Minas, é a ausência absoluta de preconceito de cor ou de origem servil, que só mais tarde começou a se esboçar, introduzido por outros estrangeiros. O escravo forro passava a gozar em toda a plenitude dos mesmos direitos de seus antigos senhores e emparelhava com ele, nos negócios, na opulência e até na vida social.” (Visões do Passado, p. 20, 21).

 Opinou Gilberto Freyre, quanto à miscigenação do português com o autóctone índio e com o preto: “Depois de Cristo, ninguém tinha contribuído mais do que o português para a fraternidade entre os homens” (O mundo que o português criou, p. 54).

 No Brasil, até a publicação de Casa grande e senzala, era consensual que a miscigenação fora-nos fator de atraso, idéia que asinha se reverteu em pról do reconhecimento dos benefícios dela. Edgard de Roquette-Pinto, antropólogo e positivista, foi pioneiro na desmitificação da pretendida ruindade do hibridismo de brancos com pretos e índios no Brasil: o atraso brasileiro resultava da enfermidade e da carência de instrução: o Brasil era como grande hospital de pacientes sem terapia, e ignorantes. Esses, seus males, não o da mistura de gentes.

Paulo (Paul) Descours, positivista, sobre o estado das colônias britânicas em 1904: “[…] o público inglês sempre pensa que a Índia é rica, enquanto em realidade ela é paupérrima atualmente. [A Índia era possessão britânica].

 No Transvaal, os negócios vão malíssimos. Falo dos campesinos arruinados por nossa [dos britânicos] ocupação da região.

 Em Orange [possessão britânica] […] o estado desta região, essencialmente agrícola, é tristíssimo. Toda a gente reconhece que esta república era otimamente governada e que os ingleses não foram aí, absolutamente, perseguidos, o que não nos impediu [aos ingleses] de fazer dele um deserto”.

 (Descours, P. Boletim da Inglaterra, in Revista Ocidental, tomo XXXI, Paris, 1905, p. 47-8. Foi uma das principais revistas dos positivistas por décadas).

 Oh, que pena o Brasil não ter sido inglês… Oh, que desgraça isto ter sido português…

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