Um recurso interessante do belo idioma que é o Português, consiste em atribuir dois pronomes ao mesmo verbo, como:
“Quem se lhe opõe”, em lugar de “Quem se opõe a ele”;
“Pouco se me dá” em lugar de “Pouco se dá a mim”,
“A corda enroscou-se-lhe na mão” em vez de “A corda enroscou-se na mão dele”,
“Atentou-se-lhe no crescimento” em vez de “Atentou-se no seu crescimento”, “Atentou-se no crescimento dele”.
Este tipo de construção é econômica, elegante, correta. Ela não é difícil, não é “preciosista”, não é “acadêmica”, não é “lusitanismo”. Aliás, isto de tachar de lusitanismo certas construções, como esta, e recursos, como a mesóclise, é pura bobagem: em Portugal, as pessoas e até as crianças, sabem os recursos do nosso idioma e usam-no, diferentemente do brasileiro que não sabe ou sabe pouco e mal e o pouco que sabe, não usa.
Você pode usar esta construção; ela existe para ser usada. Desconhecê-la, não saber que existe, é vexatório; não a usar nunca, é empobrecedor. Digo o mesmo da mesóclise (“Poder-se-á”, “Dar-lhe-íamos”) e dos pronomes contraídos (“Darei a caixa para você” >> “Dar-lha-ei”; “Pediste o livro para mim ?” >> “Pediste-mo ?”). Se você ignora tais recursos, a sua riqueza de comunicação se empobrece, você se torna limitado e abaixo das possibilidades de exprimir-se com estilo, elegância e variedade.
Use-os, orgulhosamente, na escrita e na fala diária. Não tema os burros que estranham e criticam. Seja melhor do que eles.
É triste observar a ausência destes recursos na literatura brasileira, sintoma de que o brasileiro médio desaprendeu as riquezas do vernáculo (por exemplo: as traduções de Goethe, da Unesp, cujo tradutor insiste, inoportunamente, na próclise, ignora a mesóclise, os pronomes contraídos e o uso de dois pronomes no verbo. Redigiu tradução “à brasileira”, ou seja: pobre.)