CULPEMOS PORTUGAL PELOS MALES DO BRASIL !

CULPEMOS PORTUGAL PELOS MALES DO BRASIL !

                                                           Arthur Virmond de Lacerda Neto. 20.1.2021.

            O Brasil que a colonização portuguesa produziu é o que havia em 1822 e não o que há em 2021. Em 1822 o Brasil era produto imediato de seu passado português; de então para cá, houve tempo de sobra para que os brasileiros reformassem, corrigissem, alterassem e se não o fizeram, foi porque não o quiseram. Em 2021, faz duzentos anos que o Brasil é governado por brasileiros e toda a responsabilidade pelo que aqui se passa de bom e de errado é culpa de governantes brasileiros. Portugal já nada tem com o que se passa aqui desde 1822.

Os criticadores anti-portugueses como que estabelecem a cronologia do Brasil assim: 1500-1822; de 1822 passam para 2021 sem o interregno de 1822 a 2021, como se atualmente o Brasil houvesse acabado de independer, como se não houvessem transcorrido dois séculos, inúmeras gerações de brasileiros, regimes, governos, primeiro império, segundo império, república, regimes de Getúlio Vargas, JK, regime militar, governos de Lula.

            Os criticadores atêm-se ao passado cada vez mais distante como se fosse recentíssimo, como se estivéssemos em 1822. Não atentam em que, de 1822 por diante, temos governo próprio, governantes próprios, decisões próprias, elites próprias e que se o Brasil padece de violência, racismo, desigualdade, pobreza, é porque em 200 os brasileiros não quiseram ou não souberam dirimir tais problemas ou deixaram-nos surgir ou deixaram-nos perdurar.

            É claro que nossas origens são portuguesas e que o presente é produto do passado, porém não ao ponto de se poder inculpar passado longínquo por males presentes, com abstração do largo período de autonomia dos brasileiros. Se o presente é produto do passado anterior a 1822, é muito mais produto do passado mais recente, posterior a 1822. Assim, quando dizem: o Brasil herdou males (realmente herdou ?) de sua colonização, deve-se frisar: e herdou-os também do quanto se fez e não se fez de 1822 por diante, é mais herdeiro do período posterior a 1822 do que do anterior, pois de 1822 por diante tornou-se senhor de si próprio, com decisões políticas tomadas por seus governantes.

            O estado de coisas a que chegamos em 2021 é produto muito mais de decisões políticas de nossos governantes, de boas ou más escolhas eleitorais de nosso povo, do que os brasileiros souberam ou quiseram fazer ou não souberam nem quiseram fazer ou deixar de fazer. D. Pedro I, D. Pedro II (ao longo de 49 anos), inúmeros presidentes da república, a República Velha, o Estado Novo, os governos de Getúlio Vargas, o qüinqüênio de Juscelino, o regime militar, os governos de Luís Inácio da Silva, os de Fernando Henrique Cardoso, o atual, tudo isto integra a longa sucessão de autonomia política, econômica, educativa, legislativa, em que o passado colonial é apenas isto mesmo: história, passado e não presente atuante.

            Por isto, a ladainha pela qual se incrimina o passado anterior a 1822 por males do presente, de qualquer presente brasileiro, é bobagem, ingenuidade, infantilidade, ausência de senso histórico, negação da responsabilidade dos brasileiros por seus destinos.

É álibi típico do senso comum dos brasileiros culpar alguém, terceiros, quartos e quintos pelas mazelas do Brasil: colonização portuguesa, capitalismo, regime militar. Jamais contemplam seus esforços, o empenho de inúmeros governos por melhorar, os períodos de prosperidade e crescimento, não comparam o qualidade de vida de sucessivas gerações. É como se nada melhorasse, como se tudo sempre fosse ruim e como se tudo de ruim já existisse antes de 7 de setembro de 1822 e continuasse até ao presente. Há pessimismo antropológico e negação da história.

            Todos os governos brasileiros foram ineptos ? Nunca eles contribuíram em nada para melhorar o que fosse ? Do passado ante-1822 somente herdamos malefícios ? Ainda estamos em 1822 ? Que esforço as elites brasileiras envidaram para remediar a desigualdade, a violência, a pobreza, a ignorância ? Nenhum ? Algum ? Somos governados por Portugal ? Deixamos de sê-lo em 1822 ? Ou não ?

            É o tradicional vezo brasileiro de arranjar culpados para a sua incapacidade, sua indiferença, sua inação, seu conformismo, com o agravante de culpar a terceiros, quartos e quintos. É típico, mas consolem-se os lusófobos: este defeito é bem brasileiro, que em Portugal têm-se vergonha na cara e assumem-se as próprias deficiências e responsabilidades.

            É mais fácil desfazer um átomo do que um preconceito, dizia Alberto Einstein.

Em tempo: minhas 10 ou 12 publicações nas comunidades História do Brasil e História do Brasil — colônia e império, no Facebook, sobre degredados no Brasil, colonização do Brasil, holandeses no Brasil, EUA x Brasil, miscigenação no Brasil, extermínio dos índios no Brasil, têm tido muito favorável repercussão, com centenas de comentários de muitas dezenas de compartilhamentos. Muitos agradecem-me pelas informações que lhes propiciei, normalmente sonegadas pela historiografia anti-portuguesa, pelos modos de ver que lhes são novos, pelo acréscimo de informações, de dados, de conhecimento de que o brasileiro médio é carente e cuja carência milita poderosamente na manutenção de preconceitos, do pessimismo do brasileiro em relação às suas história e identidade. Há comentários intensamente anti-portugueses, raivosos, que veiculam o produto do tal preconceito e da tal carência. Feliz e surpreendentemente, são minoritários.

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