Holandeses no Brasil: o mito.

Carlos Lisboa Mendonça: “[…] não foram os holandeses que levaram o progresso a Pernambuco: mesmo antes da sua invasão, aquela já era provavelmente a mais desenvolvida região do Brasil.” (500 anos do descobrimento, editora Destaque, 2000, p. 197).

Excetuando o período de Nassau, a dominação holandesa se constituiu, em seus vinte e cinco anos, em um dos mais negros períodos da história do nordeste brasileiro da era colonial. A conquista de cada vila ou povoado foi marcada por atos de desnecessária barbaridade, agravada pela intolerância religiosa calvinista, com freqüentes massacres. A população dominada era submetida à mais dura exploração econômica, além de opressão política e religiosa.” (Idem, p. 198).“[…] das conquistas e da colonização holandesa em todo o mundo, não existe um só exemplo de prosperidade.” (Idem, p. 200).

Sobre os franceses, o mesmo autor assere: “Seus povos coloniais se conservaram atrasados, ignorantes e em grande estado de pobreza”. (Idem, p. 197).

Rubem Descartes de Garcia Paula, positivista: Para melhor conhecimento dos mal informados sobre certos aspectos do colonialismo de todos os tempos, da parte de certos brasileiros que até hoje “choram” por não haver o colonialismo holandês vingado no Brasil; por haverem os portugueses e brasileiros expulsado os ditos holandeses, destroçando sua ocupação de grande parte de nosso território, vamos avivar-lhes o pensamento. (Isto sem embargo de reconhecermos facetas importantes – de ação progressista- do governo do “ocupador” príncipe Maurício de Nassau):Amigo meu, químico-pesquisador de grande valor, Reinout F. A. Altman, natural da Indonésia, ex-cidadão holandês, hoje cidadão brasileiro – que ama e serve lealmente à sua pátria de adoção, conta-nos (o Dr. Altman) o qual após haver-se formado na Holanda, voltou a trabalhar em Java, conta-nos,repetimos, que por ocasião da ocupação das antigas Índias Orientais Neerlandesas pelos japoneses, 1942-5, o que marcou o fim da dominação holandesa e independência daquele vastíssimo arquipélago abrigando, então, 60 milhões de habitantes, contava com somente (vede bem) oito estabelecimentos de ensino secundário (colégios) e três estabelecimentos de ensino superior: Escolas de Direito, de Medicina e de Engenharia Civil.Isto em pleno século XX , depois de mais de trezentos anos de ocupação! (Subdesenvolvimento. Mancha a apagar, Rio de Janeiro, 1970, páginas 153 e 154.).

Sukarno, presidente da Indonésia: Deixou-nos [a Holanda, na Indonésia], após 350 anos, com uma proporção de 94 por cento de analfabetos. Deixou-nos praticamente sem médicos, que pudessem, pelo menos, prestar assistência aos moribundos. Deixaram-nos com uma estrutura econômica e social tipicamente colonial.Digo-vos solenemente: nos onze anos da nossa independência a nação indonésia conseguiu mais progresso humano, e tem sido palco de maior felicidade humana do que durante todas as gerações passadas de colonialismo. (A democracia indonésia, Sukarno, 1959, p. 72).

Tito Lívio Ferreira: Sobre os holandeses que ocuparam o Brasil: “Corsários e piratas de alto-mar constituíram a organização comercial da W.I.C. (Companhia das índias Ocidentais). Na Holanda ela não gozava de boa tradição. Via-se nela, segundo a definiu Sombart, “Des Bourgeois”: “Nada mais do que uma associação semibélica para fim de conquista, com direitos soberanos e amplíssimos meios defensivos, que exercitava a pirataria em grande escala e a essa atividade principal devia verdadeiramente os seus lucros. Daí suas tentativas de colonização fracassarem. Comerciante, mercantilizada, seus objetivos se voltavam para o lucro obtido com a maior rapidez possível.” (Tito Lívio Ferreira, Portugal no Brasil e no mundo, p. 20).Enquanto Portugal povoou o Brasil com a sua gente e a sua organização política e administrativa, “o governo da Holanda nada tinha com a Companhia das Indias Ocidentais, uma sociedade mercantil de judeus, com carta de pirata para poder assaltar e roubar, no mar e em terra. Do produto do roubo, o governo holandês cobrava uma percentagem.” (Tito Lívio Ferreira, Portugal no Brasil e no mundo, p. 32). O exército da Companhia das Indias Ocidentais compunha-se de mercenários franceses e polacos, chefiados por franceses e polacos. Completa: “E esse exército de ocupação não merecia confiança, por isso era sempre renovado.” (Tito Lívio Ferreira, Portugal no Brasil e no mundo, p. 32).

Gilberto Freyre: se perdurasse a presença holandesa, o nordeste seria, talvez mais rico, porém com mais desigualdades sociais, pobreza acentuada da parte dos negros, índios, luso-brasileiros; riqueza acentuada da parte dos holandeses e judeus;segregação racial: holandeses de um lado; os demais de outro.

Os holandeses invadiram o nordeste brasileiro:

por ser a porção mais rica e próspera do Brasil,

não vieram trazer riqueza, porém pilhar a que os luso-brasileiros haviam criado,

não vieram com povo e Estado, porém com uma companhia mercantil,não vieram criar civilização, porém exclusivamente parasitar a civilização criada pelos luso-brasileiros.

O Conde de Nassau, homem de qualidades superiores, não era representativo do holandês típico nem a sua atuação foi especialmente benéfica. Ele encomendou a um seu patrício a redação de livro apologético, que lhe enaltecesse as virtudes e a atuação, livro que impressionou os leitores brasileiros e que originou o mito da superioridade holandesa, como se todos os holandeses fossem comparáveis a Nassau e como se a sua atuação fosse típica da atuação holandesa. Nada mais falso.

Na própria Holanda, esqueceu-se completamente o período da ocupação holandesa do Brasil – é ponto da história holandesa que, lá, se omite e não se recorda, ao passo que no Brasil, mantém-se o mito da suposta excelência holandesa como colonizador

.Professor da Universidade de Leiden e autor de ”Amsterdam’s Atlantic: Print Culture and the Making of Dutch Brazil” (Atlântico de Amsterdã: a cultura impressa e a construção do Brasil holandês, University of Pennsylvania Press), van Groesen é conhecedor do período em que a Holanda dominou o nordeste do Brasil, entre 1624 e 1654.Em entrefala publicada em 16 de março de 2017[1], concedida ao blogue Brasilianismo, assim ele respondeu:

“Brasilianismo – Muitos brasileiros acham que, se os holandeses tivessem ficado no Brasil, um lugar como Pernambuco seria mais desenvolvido do que é hoje. Como seria o Brasil, caso a Holanda nao tivesse perdido o território no Nordeste?

Michiel van Groesen –É uma ilusão achar que o Nordeste estaria melhor. Isso persiste por causa de Nassau e do trabalho e relações públicas feito por ele no século 17. Isso se baseia em publicações pagas por Nassau para divulgar essa imagem positiva.Apesar de ser uma ilusão, é essa ilusão que protege a memória do Brasil holandês.

A falta dessa ilusão na Europa faz com que os holandeses não conheçam a história. Então a ilusão tem benefícios. É impressionante que essa ilusão seja tão poderosa em uma região do Brasil e inexistente completamente na Holanda.”

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