Carta a uma gazeta homofóbica

   Carta que dirigi ao diretor da gazeta direitista Inconfiência, a propósito do seu número 163, em 14 de maio de 2011.

  Ilmo. Sr.

  Coronel Carlos Miguez.
  De posse de um exemplar da gazeta Inconfidência, número 163, depararam-se-me alguns artigos relacionados com o combate às iniciativas governamentias, no âmbito da sexualidade.
  Antes de tudo, quero deixar-lhe explícito que não sou marxista, não sou petista, não sou esquerdista, não sou gramscista, como não sou cristão, não sou católico, não acredito em deus nem na Bíblia.
   A homossexualidade corresponde a um dado da natureza humana, a um fato da sexualidade do ser humano. Sempre existiu e sempre existirá.
  A homofobia corresponde a um dado da cultura, a um fato criado artificialmente por certa religião, no ocidente, a saber, o cristianismo.
  O ser humano é espontaneamente heterossexual, homossexual e bissexual; certas pessoas são culturalmente homofóbicas.
  Por séculos a fio, o cristianismo condicionou as mentalidades no ocidentes e, neste condicionamento, criou a ginofobia (ódio às mulheres, no início da Idade Média), o anti-semitismo, o ódio aos protestantes e o aos homossexuais.
  O movimento pró-gueis, tão evidente nos últimos anos, corresponde a um avanço no sentido da liberdade de ser e de fazer, e a um avanço no sentido da igualdade de tratamento em favor de pessoas até aqui discriminadas.
  Obviamente, todos são livres de repudiarem a homossexualidade, ao mesmo tempo em que todos devem respeitar a condição sexual do seu semelhante.
   É alarmista e ridícula, no seu histrionismo, a afirmação de que o governo atual pretende transformar crianças em homossexuais. Ninguém é transformado em homo, como tampouco em hetero.
  Vocês, da direita, preocupam-se excessivamente com a liberdade alheia, com a sexualidade alheia, com a privacidade alheia, quero dizer, com a homossexualidade alheia, como se ela devesse ser proibida. Vocês, heterossexuais da direita, adotam uma atitude prepotente e arrogante; vocês são homofóbicos e fomentam a discriminação, mercê da  premissa de que a heterossexualidade corresponde à norma, ao correto, ao ideal de sexualidade e pretendem calar toda expressão oposta aos vossos valores.
  Vocês, da direita, pretendem-se porta-vozes dos valores do liberalismo econômico e político, e, no entanto, praticam o seu oposto, ou seja, pretendem que haja liberdade, desde que seja a de enaltecer-se a heterossexualidade. Nada mais totalitário,  nada mais oposto aos vossos ideais.
  No movimento guei não há nenhum ataque à família tradicional e nenhuma impugñação da heterossexual, daí que a grita da direita apresenta exclusivamente o caráter de intolerância e de desrespeito humano.
  É, a vossa, uma causa perdida. Por maior que seja a vossa indignação, felizmente, os costumes alteram-se e a natureza humana prevalecerá ali onde houver liberdade. O movimento guei deseja apenas isto: liberdade para todos e discriminação contra ninguém. São dois valores que certa direita, decididamente, despreza.
    A direita homofóbica ou a parcela homofóbica da direita encarna uma postura que já vai sendo arcaica e que será progressivamente minoritária. Tanto pior para ela que, já tão combatida pelo esquerdismo que prepondera entre nós, desmoraliza-se ainda mais, pelo retrógrado desta sua posição; tanto melhor para a esquerda que, nisto, adota o valor da liberdade e que adotou uma causa profundamente humana, profundamente justa e profundamente libertária.
   
 Saúde e fraternidade.
 Arthur Virmond de Lacerda Neto
 
arthurlacerda@onda.com.br
 
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