Porque os pais evitam falar de sexo com os seus filhos.

Por que os pais evitam de falar de sexo com os seus filhos?                         Fevereiro de 2004

 

            Os pais evitam de falar de sexo com os seus filhos porque são católicos ou evangélicos  e aprenderam a considerar o sexo como impuro e pecaminoso, que os desconforta; porque os pais deles não falavam disto e eles sentem-se pouco à vontade nesta matéria; porque, como eles próprios o praticam (por óbvio), sabem que ele envolve intimidades, os sentimentos da mulher, os seus melindres, as necessidades do marido, como ele atua quando a mulher não se acha propensa, em suma, envolve particularidades das pessoas, muito íntimas, íntimas a ponto de que o pai e a mãe não as querem partilhar com terceiros, e os filhos são terceiros.

             Por mais que sejam filhos, são pessoas  com quem eles não se sentem à vontade para falar disto, até certo ponto, ou seja, até o ponto em que estas conversas entram na intimidade deles. Nesta intimidade não entra falar-se, por exemplo, da menstruação, da libido, dos preservativos, das doenças, etc, enquanto assuntos impessoais, que qualquer pessoa pode abordar sem se referir a si própria e, portanto, a cujo respeito os pais poderiam sentir-se à vontade para falar.

                         Porém inibem-se porque  tocar nisto é, em parte, dizer de algo que pertence à sua própria experiência e à sua mais recôndita intimidade, que eles preferem conservar em privacidade. Por mais que tencionem falar impessoalmente, como se a sexualidade não entendesse com eles, como se  fossem insexuados,  acabam dizendo, mais, ou menos, direta ou indiretamente, da sua própria experiência e da sua própria intimidade, porque se falam, é do que sabem e o que mais sabem, é de si próprios. Talvez também não se queiram expor às perguntas dos filhos a esse propósito, e quer o temor delas, quer o recato da intimidade conjugal, leva-os a uma atitude de defesa que se  traduz no silêncio.

            Falar de sexo é difícil, ao menos entre nós, porque  sexo é assunto da intimidade do casal e porque nos nossos padrões culturais  a sexualidade corresponde a assunto tabu, resultado direto do catolicismo.

            É claro que os pais, se falam nisto, devem saber até onde querem falar, ou seja, até o que é sexo pura e simplesmente ou até o que ele é neles, pais.  Haverá pais, ou mães, ou ambos, mais abertos aos filhos, que lhes falem da sexualidade vivida pelo casal; haverá pais, ou mães,  ou ambos, no caso oposto; haverá pais, ou mães, ou ambos, nos mais variados graus intermediários entre estes dois extremos.

            Há ainda outro motivo do silêncio à volta da sexualidade: é que, falando ou não os genitores, os filhos, cedo ou tarde, acabarão por saber tudo a respeito, seja por experiência própria, por aulas na escola ou por ouvir dizer aos amigos. Se é fatal que os filhos descubram o que é o sexo, por que os pais hão de passar pelo dissabor de falar de tema que os constrange? É uma atitude comodista, cujo resultado é o de que os jovens vão aprender sobre sexo muitas vezes erradamente, carecendo de uma orientação que porventura desejam e não recebem, sem saber a quem recorrer.

            O desejável é que os pais falem de sexo aos filhos, por tratar-se de uma realidade natural, que  será também a deles,  por ser função dos pais orientá-los e formá-los e porque os filhos sentem necessidade de esclarecimentos na matéria, mormente na adolescência, quando o corpo sofre transformações drásticas. (É incrível pensar que, no Brasil, em décadas que já lá vão, as mulheres casavam-se ignorando a existência da ereção e da penetração!).

                  O interessante, no sentido irônico, é que a maioria dos pais não fala disto com os filhos, embora, certamente, o pai, em solteiro e também quando casado, fizesse-o com os amigos, ou seja, não há inibição com estes, que partilham de experiências semelhantes ou com quem ele partilha das suas; há inibição com os filhos, porque eles entendem que falar de sexo é informar e partilhar; eles aceitam informar, porém evitam o partilhar. Estes pais, ainda que tratem os seus filhos como amigos, nisto, não os tratam nessa condição, embora, por outro lado, haja pais que os tratem como amigos em geral e também nisto: estes são os melhores pais (e mães).

                  (A natureza privada característica da vida  sexual, seja dos casais, seja das pessoas em geral, indu-las a uma natural reserva a respeito, pelo que a desinibição com que alguns alardeiam a sua sexualidade e dela se jactam, permite a conclusão de que mentem: quanto maior a gabolice, tanto maior a fantasia).

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2 respostas para Porque os pais evitam falar de sexo com os seus filhos.

  1. Ricardo Vieira disse:

    Mas qual é a sua posição a respeito: os pais devem ou não falar de sexo com os filhos? E no caso de pais hmossexuais que adotaram crianças, devem falar sobre sexualidade ou não? o q vc pensa a respeito? Grato. Ricardo Vieira (psicólogo clínico/pesquisador/psicanalista).

    • arthurlacerda disse:

      A minha opinião é a de que os pais devem falar de sexo com os seus filhos, com naturalidade, sem tabus nem preconceitos, com abertura, inclusivamente no caso de pais homossexuais que adotarem crianças. A homossexualidade dos pais ou mães, na sua condição de adotantes ou pais naturais deve ser assunto de abertura e de diálogo; o mesmo se os pais forem heteros ou se um deles for hetero e o outro, homo. Em suma: abertura, verdade, diálogo.

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