DICIONÁRIO É PAI DOS BURROS ?

DICIONÁRIO É PAI DOS BURROS ?

A expressão pai dos burros é designação brasileira e popular dos dicionários em geral; diz-se: Consulte o pai dos burros, Veja no pai dos burros. Não se quer significar que o dicionário seja, metaforicamente, genitor do consulente e que este seja burro, isto é, bronco, estúpido.

Burro é substantivo polissêmico, que nomeia: animal quadrúpede; jogo de cartas de regras simples, o perdedor nesse jogo; (atente agora) tradução literal de autores clássicos para auxílio de estudantes de línguas antigas.

Em jargão escolar, burro (ou pai velho) era texto de versão do grego ou do latim (porventura de outro idioma) efetuada para português, palavra por palavra, com atenção antes à literalidade do que ao sentido do original. Perante palavras que desconhecia, o estudante servia-se do dicionário, por isto pai dos burros, ou seja, “pai” dos textos traduzidos literalmente, mentor desses textos.

É lendária a explicação (encontradiça na rede) segundo a qual essa locução proviria de que o genitor de Aurélio Buarque de Holanda, autor de dicionário, era construtor de carroças tiradas por burros, elogiadas por seus fregueses com tantos e tão variegados adjetivos, que Aurélio decidiu anotá-los, com o que se originou seu dicionário.

Também é enganoso explicar a locução pela suposta ignorância de quem consulta dicionários, até porque depreciativamente burro não equivale a ignorante, inculto, desprovido de conhecimentos intelectuais, senão a tolo, bronco, obtuso.

Na coloquialidade brasileira: a) bom pra burro é enaltecedor: equivale a muito bom, ótimo; em Portugal diz-se fixe, porreiro; b) pra burro significa em grande quantidade: Veio gente pra burro.

Como adjetivo coloquial brasileiro, burro é pejorativo, equivalente a bronco, estúpido, de inteligência curta, correntio no Brasil e presente em Lisboa em finais do século XIX (consta no romance “O barão de Lavos”, do português Abel Acácio de Almeida Botelho, de 1891, com entrecho em Lisboa). Desde pelo menos os anos 1990, em Portugal aplicam-se os pejorativos parvo e estúpido, não mais burro, embora provavelmente volte a circular, por efeito do abrasileiramento do linguajar dos portugueses.

Burro de carga é o animal cargueiro, empregado no transporte de cargas; metaforicamente designa a pessoa que realiza tarefas que a outrem deveriam incumbir, que se sujeita a fazer o que terceiros deveriam fazer. Dar com os burros n`água é expressão já presente em 1733, em peça de Antonio José da Silva; significa malograr-se, dar errado, descontrolar-se, perder domínio de si próprio.

Esse post foi publicado em Língua portuguesa, Vício de linguagem, Vernáculo.. Bookmark o link permanente.

Deixe um comentário