“- Fico feliz que você veio.” Preposições.

Sinal infalível de zelo pelo idioma é usar as preposições corretas e, reciprocamente, sinal infalível de sub-instrução em língua portuguesa, de vulgaridade, de coloquialidade, é desusá-las.

(1)

– Fico feliz que você veio.

Fica-se feliz POR algo: “Fico feliz por que você veio”; “Fico feliz por você ter vindo”. A preposição POR dá lógica à construção. Com ela:
– Fico feliz por isto. [Faz sentido].
Sem ela:
– Fico feliz isto. [Não faz sentido.].
-Fico feliz que isto. [Não faz sentido.].

-Fico feliz de isto. [Não faz sentido.].

-Fico feliz de seus anos. [Não faz sentido.].

(2)

-Obrigado que você abriu a porta.

Agradece-se POR; obrigado POR.

-Obrigado por algo. [Faz sentido.].

-Obrigado porque você abriu a porta. [Faz sentido.].

-Obrigado por haver aberto a porta. [Faz sentido.].
-Obrigado algo. [Não faz sentido.].
-Obrigado que algo. [Não faz sentido.].

Não usar a preposição correta é mais uma evidência da degredação do uso do idioma no Brasil, avassalador nos últimos 30 anos. O pior é ler este tipo de primarismo nas traduções que Mario Luiz Frungillo fez de Goethe (Unesp). Leio-as e começo a desaprender ou a aprender o errado. É Goethe, homem culto em alemão, a falar como brasileiro inculto.
O tradutor quer escrever como o povo fala, quer usar a língua brasileira, quer usar a linguagem (pseudo-)culta; também a língua muda. Ele encarregou-se de consagrar as mudanças para pior. Sem emprego das preposições e da forma erradamente transitiva direta de verbos transitivos indiretos amesquinhou o vernáculo, desmereceu-lhe o trabalho e desensinou o leitor, aspecto, o terceiro, em que Mário Luiz Frungillo é responsável por dar difundir o errado ou consagrá-lo, em vez de registrar o certo e a norma culta. Não foi em alemão reles que Goethe falou nem Eckermann escreveu: traduzisse com português impecável, para haver coerência com o original. Ainda que Goethe nem Eckermann se houvesse exprimido corretamente, nada justifica a gramática do tradutor que se acompanha alguma coisa, são os erros e os vícios que ele deveria ter evitado.  Ele perdeu a oportunidade de sua vida de perenizar seu nome como tradutor.

Nivelar por cima, praticar a excelência, ter qualidade impecável não se obtêm se o tradutor incorpora os vícios, os sestros, os erros, as simplificações resultantes do SUB-CONHECIMENTO. Ele nivela por baixo. Educação militante (Paulo Freire) + sociolongüística (Marcos Bagno) = dá nisto.

 

 

 

Esse post foi publicado em Preconceito lingüístico, Preposições., Vício de linguagem, Vernáculo.. Bookmark o link permanente.

Deixe um comentário